Prestes a realizar uma convenção nacional que se revela como divisor de águas na vida do partido, o PSDB tem o desafio de resolver sua maior crise interna para viabilizar a candidatura própria em 2018. Protagonista nas disputas à Presidência, desde a redemocratização, a sigla, hoje, está em quarto lugar nas pesquisas de intenção de voto, tendo seu peso ofuscado, no mesmo espectro político, por nomes como Jair Bolsonaro (PSC), Marina Silva (Rede) e o apresentador de TV Luciano Huck. Especialistas acreditam que a centro-direita deveria se unificar para enfrentar o primeiro colocado, o ex-presidente Lula (PT).
No entanto, o desafio de unificar os partidos de centro-direita não é o único enfrentado pelo PSDB. A legenda também passa por uma divisão interna. E o favorito para disputar o cargo pelo PSDB, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, tem nas mãos a missão de conciliar os tucanos para tentar a unificação da centro-direita.
Hoje, o partido está dividido entre os favoráveis à participação no governo Temer e os contrários. Um racha que pode impactar, diretamente, na performance eleitoral tucana. A narrativa da crise do PSDB, contudo, se iniciou no período pós-impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, cujo protagonista foi o PSDB e o senador Aécio Neves, que disputou a eleição de 2014 contra o PT. “A participação no governo é consequência do nosso protagonismo no impeachment. Assim como nós fizemos com Itamar Franco, quando participamos do impeachment do Collor, tivemos participação e ajudamos a fazer o plano Real. Agora, a gente liderou o impeachment e vai dar as costas ao governo?”, pondera o deputado Marcus Pestana (MG).
Para Pestana, já estava subentendida a obrigação de dar sustentação a esse momento de retomada do crescimento econômico e transição democrática, representada por Temer. O partido conseguiu, em 2016, angariar quatro ministérios, se somando à estrutura de seis governadores, uma bancada federal, formada por 46 deputados e 11 senadores. Esse forte agrupamento foi capaz de eleger 803 prefeitos e milhares de vereadores. A sigla ainda contava com o lastro de 50 milhões de votos obtidos por Aécio em 2014, o que indicava uma crescente de poder. Foi assim que se tornou o maior fiador do PMDB, permitindo que pontos importantes, como PEC do Teto dos Gastos, Terceirização e Reforma Trabalhista fossem aprovados no Congresso.
Crise – O colapso em que o PSDB se encontra ocorreu quando Aécio foi atingido pela delação dos executivos da JBS, em maio. Ele foi afastado da presidência da sigla e Tasso Jereissati (CE) passou a conduzir uma espécie de expurgo, cujo programa partidário, divulgado em agosto,U tinha como máxima a conclusão de que “o PSDB errou”. Para o deputado Daniel Coelho, ligado ao grupo dos “cabeças-pretas”, esse erro moral se deve à ocorrência de “correligionários que praticaram ou conviveram com casos de corrupção”. “Não precisávamos participar do governo para apoiar as reformas que defendemos. Nosso compromisso é com as reformas”.
Do outro lado, figuras como o ex-ministro das Cidades, Bruno Araújo (PSDB), defendem uma linha mais próxima do Planalto. A diferença ficou clara na convenção estadual do PSDB-PE, onde Bruno foi eleito presidente e Daniel abandonou o evento aos gritos de “Fora Temer”. Enquanto Bruno fazia o discurso em defesa do presidente da República e comparecia às votações de denúncia para salvar Temer, Daniel e Betinho Gomes combatiam frontalmente os governistas.
Debate – O remédio que se fabricou para o imbróglio foi uma nova presidência no PSDB. Tasso Jereissati, que já estava à frente da sigla, e tem como adeptos o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e Geraldo Alckmin, era visto como uma dura solução para a crise ética dos tucanos. Defensor do senador cearense, o líder do PSDB na Câmara, Ricardo Trípoli, explica que o partido deve rumar para mais perto da sociedade, com a coragem de assumir seus erros. “A imensa maioria pensa assim. Nós não podemos confundir questões programáticas com questões éticas”, admite o deputado.
O professor de ciência política Marcos Nobre (Unicamp) indica que a causa da divisão do PSDB é a posição que o governo Temer quer ter na sucessão de 2018. “Temer não se conforma em ser um Sarney, que não influenciou sua sucessão, por isso intervém dentro do PSDB, principalmente via Eliseu Padilha (Casa Civil). O PSDB é o único partido que poderia aglutinar forças de centro e considerar alguns aspectos do governo como positivos”, esclarece. O governador Marconi Perillo (GO) surge como concorrente de Jereissati nesse sentido, de reunir os ministros e demais defensores do governo, caso dos pernambucanos Bruno Araújo e Guilherme Coelho. Perillo é aliado de Aécio e encarado como o nome de unificação.
O problema é que, segundo Nobre, qualquer presidenciável competitivo não pode ser ligado a Temer. “Sair do governo não está mais em dúvida, já é uma realidade. A grande pergunta é: que peso tem o governo Temer numa candidatura tucana?”, questiona o professor. “Alckmin tem certeza que a candidatura dele é inviável se Temer tiver ingerência sobre ela. Só que apoiar Tasso levaria o partido a um racha maior ainda”, completa. Ao contrário da previsão dos próprios tucanos consultados, o cientista político acredita numa vitória de Perillo, por uma questão de sobrevivência. A alternativa é Alckmin disputar a convenção, mas é difícil convencer Tasso.
A eleição de 2018 será disputada com financiamento público e, segundo Marcos Nobre, aqueles que tiverem máquina terão sucesso. Enquanto Alckmin tem o governo de São Paulo nas mãos para barganhar apoios, Aécio e o grupo dos “sem máquina” precisarão grudar no governo federal para consolidar a campanha. Nesse contexto, caso haja um bate-chapa entre Jereissati e Perillo, é muito provável que o racha se acentue e que os perdedores abandonem o navio em 2019.
Fator PSB– A chave dessa eleição estaria em Pernambuco, de acordo com o cientista político. O PSB poderia viabilizar a candidatura do PSDB em 2018. “A chance do Alckmin reside em ele ser candidato unitário da centro-direita. Caso haja múltiplas candidaturas, as chances caem muito. Esse foi o motivo de ele vir ao Recife, para mostrar aos tucanos que teria no PSB a pecinha que faltava para alavancar o projeto tucano no tabuleiro político”, justifica.
A leitura é de que o PSB percebeu que tem tempo de TV e número estratégico de parlamentares para negociar apoio em 2018. “O PSB está fazendo uma coisa que nenhum partido fez. Disse ‘sim’ a todos os partidos. Eles têm num arco de possibilidades Alckmin, Lula, Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva”, explica. Essa condição foi confirmada pelo presidente do PSB, Carlos Siqueira. Ele estaria considerando o que for mais vantajoso para os projetos majoritários do PSB nos estados, como é o caso de Paulo Câmara. Antes da saída de Tasso da presidência, o PSDB parecia ser a melhor solução nesse tabuleiro, mas a ruptura colocou Alckmin em maus lençóis. Existe, ainda, a possibilidade do projeto majoritário ser sacrificado por falta de viabilidade e o PSDB investir apenas nas candidaturas proporcionais.
Entre os líderes do partido, como o ex-governador Joaquim Francisco e o ex-prefeito Elias Gomes, há a confiança de que a convenção será capaz de aparar todas as arestas. “As feridas serão expostas, mas o partido vai ter maturidade para superar”, alega o ex-governador. Crente numa vitória de Tasso, Elias Gomes crê numa que é bom fazer “uma intervenção cirúrgica” na legenda. “Precisamos fazer amputações para ter um resultado lá na frente. Podemos perder em quantidade, mas ganhamos em qualidade”, aponta.
Fonte: Didi Galvão