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O Tribunal de Contas da União acaba de reconhecer “pedaladas fiscais” do governo Lula no orçamento, algo comparável ao que levou ao impeachment de Dilma Roussef. O fato se enquadra no artigo 10 da Lei do Impeachment, que prevê como crime de responsabilidade: “infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei orçamentária”
De fato, na última quarta (22) o TCU bloqueou R$ 6 bilhões de reais do programa Pé de Meia do governo federal, por infração à lei orçamentária. Em 2024, o governo gastou mais de R$ 12 bilhões com o programa, mas previu apenas R$ 1 bilhão no orçamento de 2025. Isso não significa que o governo cortou despesas. Nos últimos dois anos, o programa já tem sido custeado por uma engenharia que burla a lei orçamentária e o arcabouço fiscal.
O governo tem usado recursos de fundos privados, conforme aprovado por lei no Congresso, mas sem que passem pelo orçamento, em prejuízo da transparência das contas e do respeito ao arcabouço fiscal, pois as despesas não vêm sendo consideradas para fins do cálculo do resultado fiscal, que é a diferença entre receitas e despesas do governo.
Parecer do TCU que ampara a decisão emitida é claro: “tal arranjo permite a expansão de gastos públicos à margem das regras fiscais vigentes, em especial, o limite de despesas estabelecido pelo Regime Fiscal Sustentável, a principal âncora fiscal do país. (…) Salienta-se o fato de os recursos não entrarem nos limites das despesas primárias e não sofrerem contingenciamento ou bloqueio para fins de cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais da LDO.”
“Além de todos os efeitos já citados, tais como a inexistência de autorização orçamentária para tal despesa, perda de rastreabilidade e redução da publicidade, esse tipo de arranjo possui outras consequências deletérias para as contas públicas no médio e longo prazo, como a perda de credibilidade do arcabouço fiscal, o que acarreta fuga de investidores, aumento do dólar e, consequentemente, aumento da inflação e das taxas de juros, entre outros.”
Em apertado resumo: o governo fez uma manobra para driblar as contas públicas, burlar o orçamento, escapar do arcabouço fiscal e turbinar os gastos com o projeto Pé-de-Meia. Assim, o crime de responsabilidade é claro.
Afinal, todo gasto público deve ser debatido entre os poderes e aprovado pelo Congresso Nacional numa lei que se chama de lei orçamentária. É ela que define o orçamento. Basicamente: o governo só pode fazer o que o povo, o Congresso, autoriza. E o que o governo fez nesse caso foi dar de ombros para o povo, para o Congresso, e gastar como queria, sem a devida autorização do Congresso, driblando as regras.
Além disso, houve outro problema: os gastos foram feitos sem a atenção ao arcabouço fiscal, que substituiu o teto de gastos, ou seja, sem o devido cuidado com manter a saúde das contas, no sentido de o governo não gastar (muito) mais do que sua receita de forma irresponsável.
Embora o crime de responsabilidade seja claro, sabemos que o impeachment de um presidente exige mais do que esse pressuposto fático, que é o crime de responsabilidade. Ele depende também de um componente político, que é a análise da conveniência da medida pelo Congresso Nacional.
Apesar do poder de cooptação que um presidente tem sobre o Congresso, há três razões para ficar mais otimista com as perspectivas de queda desse desgoverno. Primeiro, a popularidade de Lula está em declínio acelerado. Pesquisa divulgada pela Gerp há poucos dias apontou que 50% da população desaprova Lula, contra 38% que aprova.
Em segundo lugar, a relação do Congresso com o Governo vem degringolando. No fim do ano, Lula deu uma rasteira nos congressistas ao usar o ministro Flávio Dino para bloquear o dinheiro de emendas dos deputados, criando uma crise na relação entre os poderes.
Por fim, a crise econômica só cresce: déficit fiscal incontido, dívida pública crescente, dólar nas alturas, inflação lá em cima e a população insatisfeita com o preço dos alimentos. A promessa de Lula de que pobre voltaria a comer picanha quase foi substituída nesta semana pela entrega de alimentos vencidos.
Então, um clima mais desfavorável a Lula vem se desenhando. Atentos ao julgamento do TCU e ao cenário político, parlamentares de oposição passaram a se mobilizar pelo impeachment e um pedido será apresentado em breve.
É claro que o governo Lula ainda tem muita força política, mas a questão é: até quando? Depende do desenrolar dos cenários econômico e político e da mobilização da sociedade. O mais urgente, neste momento, é cobrar dos parlamentares que abram seu voto na eleição dos presidentes da câmara e senado, que têm uma atuação decisiva num processo de impeachment.